"Bati no seu carro".
É o nome da campanha que se está a tornar viral, a partir das redes sociais. Exemplifica como pode ser rápida a transformação da moral pública relativa à vida em sociedade, na era da comunicação digital.
A campanha consiste num pequeno filme, amador, realizado em Lisboa, em 2 de Abril de 2016, no qual vários veículos estacionam numa placa triangular de passeio, sobre o cruzamento da Av. Manuel da Maia com a Av. Rovisco Pais, junto ao Instituto Superior Técnico, em Lisboa.
Na ausência dos condutores é colocado um bilhete no para-brisas, a dizer “bati no seu carro”, acompanhado por um número de telemóvel. Intrigados por não encontrarem mossas na carroceria, depois de bem observar, os condutores ligam para o número anotado, de que resulta a aproximação de um peão em cadeira de rodas elétrica, que não consegue sair da estrada e choca com os automóveis. As reações são filmadas e “No excuses. Respect” é a mensagem final.
A ocupação do espaço pedonal pelo automóvel, em particular nas áreas reservadas às passadeiras, constitui um tema de comportamento cívico que levamos anos a tentar inverter; relativamente ao qual reconhecemos algumas zonas com boas práticas, enquanto noutras fechamos os olhos e achamos natural. A “caça à multa”, como é vista a função da maioria das empresas municipais de estacionamento, vai lembrando que há regras para cumprir, embora nem sempre seja bem vista por todos.
Ele é o estacionamento na passadeira, atrapalhando os peões; a paragem em segunda ou terceira fila, com os piscas ligados, limitando o trânsito que deixa de ser fluído; ou as cargas e descargas sem regra. É o tal desenrascar português que, consoante a perspetiva, oscilamos entre classificar como o elogio do chico-esperto e a condenação da falta de civismo.
A novidade, porém, é o contributo das novas tecnologias para a mudança de comportamento. O estacionamento sem escrúpulos, o cocó do cão no passeio ou no relvado do jardim, a falta cuidado com os mais fragilizados, são vários os exemplos onde, em Portugal, está a evoluir a moral coletiva do que é a apropriação aceitável do espaço público e de quais são os seus limites.
Atrasados uma vez mais em relação a outros países mais desenvolvidos, dirão alguns. Ainda que possam ter razão, prefiro colocar em evidência os aspetos positivos. Um dos quais é, certamente, o papel das novas formas de comunicação na educação coletiva.
João Pedro Costa é o director do Jornal Arquitecturas.