Os recentes projectos desenvolvidos (e implementados) nos mercados “municipais” do Bom Sucesso (no Porto), de Campo de Ourique e da Ribeira (em Lisboa), fazendo justiça à respectiva cronologia dos acontecimentos, parecem susceptíveis de poder gerar efeitos, mais ou menos, diferidos no tempo.
Para já, a fórmula de sucesso decalcável sem reservas; a médio prazo a ressaca de que a experiência não é replicável de igual forma em todos os mercados; e a longo prazo o rasgo de que em comércio só perdura a oferta que cria a procura.
Algumas questões prévias se poderiam, desde já, suscitar, sendo a principal tentar saber se o que resulta dos projectos citados serão, ainda, mercados, ou se o resultado aponta para outro(s) formato(s) de comércio distinto(s) emergente(s), quiçá, ainda não classificado(s) em qualquer tipologia conhecida.
Sejamos pragmáticos, o que resulta dos projectos mencionados não são mercados como os que conhecemos e estudamos desde os tempos idos dos chamados mercados de ferro na Europa.
Poderão ser estes os novos mercados municipais? Salve-se o nome, porque o apelido estará a ser renegado! Em termos práticos, talvez demasiado simplistas, provocador se assim o quiserem entender, a ideia básica consiste na transformação das naves centrais (principais) dos mercados municipais em placas de restauração com oferta diversificada (mais actual, de maior qualidade e, acima de tudo, … com procura efectiva!).
Se fossem criadas “placas de restauração”, tal e qual as podemos encontrar em qualquer centro comercial, nos espaços ocupados pelos mercados, o resultado seria igual? Talvez não, porque a oferta agora disponibilizada nos mercados (pelo menos nos três acima mencionados) é distinta, para melhor, daquilo que se encontra nos centros comerciais, nos fóruns, nos outlet, etc… .
Pois, primeiro ter-se-á estudado a procura e depois, em função disso, definiu-se a oferta a instalar. A questão a colocar é saber se tal estudo alguma vez terá sido feito, ou ponderado sequer, em relação aos mercados municipais (quando ainda se pretendia revitalizar o equipamento comercial, enquanto tal)? Parece-me, óbvio, que não! Por isso entraram em declínio, a quantidade e a qualidade da oferta sucumbiram e a procura procurou outros comércios.
Por outro lado, e ainda assim, manter a designação (mercado) é importante, porque, apesar de tudo, é um chamariz com forte impacte. Caso assim não fosse estar-se-ia a criar um conceito do tipo centros “restauracionais” (!?!) (onde impera a restauração) em analogia a centros comerciais (onde impera o comércio). A propriedade do espaço, a gestão da envolvente e a “institucionalidade” associada ao “dono da obra” confere-lhe algumas garantias de que caso algo corra mal nem todos sairão a perder.
Até à data, pelo que podemos observar, parece um daqueles jogos “improváveis” em que todos querem assumir o ganho, sem que daí possam sair derrotados. Se de facto de um jogo se tratasse, tal não seria possível, e o “empate” era resultado que ninguém ambicionaria, uma vez que era o resultado de partida.
O “empate era, assim, mais do que óbvio, ou seja, os comerciantes “empatavam” as autarquias, estas “empatavam” os comerciantes, ambos “empatavam” a procura/clientela, e todos sem excepção “empatavam” as respectivas cidades (espaços degradados e/ou devolutos, estacionamento abusivo, trânsito caótico, venda ambulante desregulada, meio urbano repulsivo, insegurança, deficiente higiene urbana, etc…, etc…).
O que estes projectos trouxeram, terá sido, acima de tudo, vontade de agir, empreendedorismo e, alguma, inovação, embora não me arrisque a denominá-los como projectos de revitalização comercial de mercados.
Tal não invalida, no entanto, o que já está a ocorrer, isto é, posicionam-se dezenas, repito dezenas, de outros mercados que vislumbram neste tipo de “exemplos”, boas práticas, a seguir, para salvação do comércio, gáudio da procura e grande alívio (ou talvez não!) da respectiva autarquia.
Para quem se debruce sobre o estudo das questões do comércio, não descurando obviamente as evoluções que o sector da distribuição tem conhecido, seja pela diversidade das tipologias que se têm vindo a afirmar, seja numa óptica de procura, o que resulta destes projectos deixa algum vazio no que toca a ... comércio.
O tempo dirá se tais projectos perduram, se isto é comércio, se isto é restauração, se isto é um mix, ou se, pura e simplesmente, é uma moda para a qual o tempo será, uma vez mais, implacável. Duvido que (sobre)vivam 1/20 do tempo que os mercados viveram e … fizeram viver!
João Barreta é mestre em Gestão do Território.